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16 de out. de 2010

'A garota do biquíni vermelho', musical que reverencia a vedete Sonia Mamede, estreia no Rio

Por Luiz Felipe Reis
Fonte: O GLOBO 15/10/2010


Artur Xexéo surge da coxia, caminha lentamente sobre o palco, cumprimenta os atores e brinca: - Hoje eu vou fazer todos os papéis!
Ao ouvir a voz do mais novo dramaturgo da praça, Marília Pêra entra em cena:

- Tem gente estranha por aí, ou é impressão?

A dois dias da estreia, a diretora e o autor de "A garota do biquíni vermelho" parecem calmos. Parecem. E basta a luz do Teatro Sesc Ginástico se apagar e a última sirene ressoar antes de uma passada da montagem, que Xexéo se deixa levar pelo desabafo:

- Essas músicas não saem da minha cabeça. Eu deito e elas ficam rodando, não consigo dormir direito.

Dramaturgo acidental, como se classifica, Xexéo assina não apenas o texto a ser encenado a partir desta sexta-feira, mas também se lança como compositor. São dele as letras e as melodias de duas canções que adornam o musical, que reverencia e ajuda a redescobrir a atriz Sonia Mamede. Vedete do teatro de revista, estrela das chanchadas da Atlântida, musa de Carlos Manga, partner de Oscarito e esposa televisiva de Lúcio Mauro, Sonia brilhou entre o teatro, o cinema e a TV, mas desde a sua morte, há 20 anos, caiu no esquecimento. E é pelo desejo de resgatar a cultura nacional que o produtor Eduardo Barata resolveu convidar o autor e a diretora para iluminar a vida e a obra de uma estrela que a memória do país insiste em apagar.

- Como produtor, me coloco agora um pouco como autor, no sentido de que a peça é um desejo íntimo de preservar a memória do teatro e do cinema - diz Barata. - Contamos a história de Sonia através dos seus trabalhos e espero que a peça revele a sua importância para uma nova geração. Em meio a tantos musicais trazidos de fora, resolvi olhar para dentro. Nada contra a Broadway, mas o nosso trabalho é quase o oposto. Ele é mais despojado, simples, minimalista...

Marília emenda:

- Outro dia, uma das meninas entrou no palco cantando muito bem, se remexendo demais, e aí eu disse: "Para, para! Não é por aí." As vedetes não cantavam muito bem, não dançavam muito bem. Nosso trabalho é delicado.

Há mais de dois anos, o produtor percorria os corredores da Biblioteca Nacional para uma pesquisa sobre a fase áurea do teatro brasileiro. Entre os inúmeros títulos que cruzavam seus olhos, não encontrou registros significativos sobre algumas das mais importantes humoristas do país. Considerado gênero menor, o humor brasileiro, deixado de lado pelos registros bibliográficos, chamou a atenção do produtor, que definiu a partir dali a sua a trilogia do riso, que se inicia com Sonia e se fecha com peças sobre Zezé Macedo e Consuelo Leandro. Convidado para escrever o texto, Xexéo aceitou na hora, mas demorou pouco mais de um ano para fincar o ponto final. Entre os dilemas de um autor iniciante, não chegou a sofrer com a síndrome da página em branco, mas, entre detalhes de captação, produção e inspiração, foi aos poucos criando e repensando as cenas enquanto fazia entrevistas, assistia a filmes e colhia material em conjunto com o também jornalista e pesquisador Daniel Schenker.

- Não chegou a ser um processo de redescoberta da importância da Sonia, porque eu acompanhei todas as suas fases, desde criança, mas espero que a peça revele a mais gente a dimensão do fascínio que ela e as vedetes exerciam - ele diz.

Na cabeça e nas palavras do autor, a vida de Sonia Mamede deveria ser contada através de uma espécie de delírio. Do leito de um hospital, uma injeção de morfina faz sua mente ser atravessada por flashbacks que remontam os melhores momentos de sua rica trajetória.

- A primeira cena que escrevi era longuíssima, depois fui cortando e estruturando a peça, que mergulha nas etapas de tudo o que essa mulher viveu, todos os sucessos e amores que ela teve - conta Xexéo.

No palco, Regiane Alves dança sob um diminuto biquíni vermelho, se apruma em vestidos colados salpicados por brilhantes paetês e equilibra plumas na cabeça, de onde sai um microfone que capta o sotaque nortista, a língua presa, o jeito caricato e a voz pequena mas graciosa que fez de Sonia Mamede uma atriz e humorista consagrada, além de cantora de sucessos como "Maria Chiquinha".

- Quando o Barata me convidou, a primeira pergunta que ele fez foi se eu sabia cantar. Eu nunca soube cantar. Mas quando ele disse que o texto seria do Xexéo e a direção da Marília, eu disse que sim - lembra a atriz. - No dia seguinte, liguei para desfazer o mal-entendido, me desculpar e dizer a verdade. Eu não sabia cantar. Mas eles deram força, e eu comecei a ter aulas. Não podia perder a chance de trabalhar com a Marília.

Com cerca de 20 peças no currículo como diretora, Marília Pêra é conhecida pela disciplina e pelo rigor com que encara seus trabalhos, mas também pelo cuidado com os atores e o amor pelo que ocorre em cima do palco. Fã incondicional da atriz, Regiane decidiu pela profissão ao vê-la em cena, interpretando Maria Callas em "Master class" (1996). Impressionada desde então, tomou um susto quando foi convidada para um miniteste no apartamento da atriz e ainda mais quando Marília lhe pediu que cantasse "Parabéns para você".

- No dia em que a vi no palco, foi como uma luz. Então você não faz ideia do que passou pela cabeça quando soube que ela iria me dirigir - diz Regiane. - Mas nos demos superbem, e tem uma hora que você tem de naturalizar para conseguir trabalhar. Eu me identifico com o jeito dela, com a disciplina. Nunca tive uma experiência como essa. Tanto por trabalhar com a Marília como por descobrir a Sonia.

Atraída pelo texto de um dramaturgo acidental e pela chance de moldar o talento de uma jovem atriz, Marília Pêra trata a montagem, acima de tudo, como uma oportunidade única para redimensionar a importância de uma grande atriz brasileira.

- A Regiane é muito atenta e diz coisas importantes para a montagem. Além disso, tem a sensualidade, a graça e a ingenuidade que a Sonia manteve mesmo depois do sucesso - lembra Marília. - Sonia não tinha técnica, e tudo o que fazia era intuitivamente, de forma pura. Espero que esse universo possa emocionar e alegrar as pessoas.

Um comentário:

  1. olá tudo bom?! tah rolando um sorteio para galerinha entre 13 e 19 anos para participar do Festival Teen de Cinema, TV e Novas Mídia me ajuda a divulgar!
    http://mistureba-cultural.blogspot.com/2010/11/festzoom.html

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